Mamã, porque é que os crescidos falam tanto de amor e têm tanto medo de o mostrar? Hoje no jardim vi dois senhores crescidos sentados num banco e pareciam chateados um com o outro, porque não se falaram nunca. De repente levantaram-se ao mesmo tempo e seguiram o mesmo caminho. Que coisa estranha. Eu quando vejo uma menina sozinha no parque, vou perguntar se ela quer ser minha amiga e depois vamos as duas brincar. Às vezes nunca mais nos voltamos a ver, mas sei que ela ficou feliz e isso também é amor, não é mamã?
Sabes, lá na escolinha gosto muito, muito de um menino. Mas não gosto como os crescidos gostam. Eu gosto de verdade. E ele gosta de mim também. Brincamos muito e partilhamos sempre o lanche. Amanhã vou fazer-lhe uma surpresa e vou dar-lhe a pedrinha mais bonita do jardim. Ajudas-me a escolhê-la mamã?
No outro dia vi um senhor velhinho na loja de gelados do sr. António e pediu-lhe o mais delicioso de todos. Até pediu para pôr pepitas de chocolate em cima! Pagou, sorriu e saiu. Ficou sentado à porta muito tempo e nunca comeu, nem um bocadinho. Estava a começar a ficar aborrecida com ele por ter aquele gelado tão delicioso e não o comer... Até que chegou uma senhora velhinha e se sentou ao lado dele. Estavam os dois muito felizes e afinal o gelado era para ela. Nem sabes o sorriso gigante do senhor a olhar para ela, enquanto se lambusava toda. E o beijinho que ela lhe deu no fim, que foi tão grande e barulhento como os que me dás às vezes. Aquilo era mesmo amor, e eles eram muito crescidos. Se calhar só os crescidos mais ou menos é que não sabem o que isso é. Ou se calhar sabem mas esqueceram-se, porque andam sempre a correr e com pressa e depois, quando ficam ainda mais crescidos, muito crescidos e com tempo, voltam-se a lembrar. Tu ainda te lembras do que é amor mamã?
Se não, porque ainda és crescida mais ou menos, vou-te ajudar a lembrar. Amo-te muito mamã.