sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

Chega a tornar-se exaustivo
Pensar ao invés de viver,
Procurar o sentido do que não tem de ter
Sabendo que não o há.

Para quê a pergunta,
A dúvida, a intriga
Se nada deste mundo levamos
Além do que está.

É no olhar que existe a razão e
O coração somente serve de engano.
Pois desengane-se o meu
Que o olhar me basta.

Que sei eu de saudade ou falta
Se isto de agora não me falta
E o que é presente, por o ser,
Não causa saudade?

Há, contudo, uma miragem
Enganosa ao olhar,
Que se diz ser dono do que de real
Acontece em mim.

O pensar que se torna neblina
E mataforiza o concreto. O claro.
Dá nova tonalidade ao que cor própria tem
E faz crer haver coisa diferente.

Os sentidos que prevaleçam -
Mas a minha sorte não a dito -
E a prece que sempre faço
É a de amar como quem vive.

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Carta ao meu filho...

Meu querido,

passei mais de metade da minha vida a ensinar-te o sentido dela, e errei. Amadurecemos à pressa, crescemos num pulo, aprendemos que é o dinheiro que nos traz sustento, lemos banalidades nos calhamaços da escola e acreditamos serem verdades, formatamos os nossos filhos impedindo-os de serem crianças, vivemos de rotinas apertadas, imitamos a multidão para nos integrarmos na sociedade e morremos satisfeitos com pão na mesa e um tostão velho no bolso.

passei menos de metade da minha vida a sobreviver, e errei. Sempre me impuseram regras restritas de horários sufocantes e normas que tinha obrigatoriamente de cumprir. Foi-me incutida a realidade de ser essencial um bom trabalho para ter uma vida às direitas. Moldavam a minha personalidade com conversas baratas e balelas bem contadas. Faziam de mim marioneta e eu aceitava os teatros forçados.

passei a minha vida com um "vou andando", e errei. Venho agora dizer-te, meu filho, que não te permito que erres como eu. Tens mais de metade da tua vida pela frente e todo o tempo é indispensável para te salvares do insaciável "vai-se indo". Vê o bom de tudo. Na totalidade das coisas há sempre uma percentagem de prazer. Há em cada milímetro de vida, um viver. Não jogues ao toca-e-foge com a felicidade. Toca-a, agarra-a e não a deixes fugir. Ama com a pele. Ama com os lábios, com os olhos, com os ouvidos, com o nariz, com tudo. Esquece as dietas detox e ataca aquela tablete de chocolate que tens escondida na gaveta da tua secretária. Tira os sapatos quando te sentares à sombra daquela árvore grande lá do jardim, enquanto lês um bom livro infantil. Joga à bola com os miúdos do bairro e perde para os deixares ser os campeões mundiais de futebol de rua. Vai a festas e come à fartazana. Aproveita o cheiro das castanhas assadas e da terra molhada de outubro. Abraça fortemente quem amas e quem não amas. Falha que nem um maluco por amor e conquista aquela pessoa todos os dias. Grita com toda a tua força depois de uma caminhada pelo meio do nada. Dança quando estiveres triste e quando estiveres feliz. Canta mesmo que desafines. Vive em nome do prazer. Beija sem limites. Sonha com o impossível e realiza-o. Ri às gargalhadas no meio das pessoas e contagia quem te rodeia. Partilha pastilhas elásticas. Faz serenatas à tua amada às tantas da madrugada. Leva os teus filhos a conhecer o mundo. Vê filmes de animação sem medo de chorar que nem um desalmado. Vai ao cinema sempre que te der na real gana. Conta segredos ao vento. Sua que nem um perdido enquanto brincas aos super-heróis no chão da sala. Vai para o trabalho de fato de treino se te apetecer. Nunca desistas do que desejas de alma e coração. Rebola na areia todo molhado. Agarra todas as oportunidades de seres feliz com unhas e dentes. Aprende e ensina a andar de patins ao mesmo tempo. Adormece no sofá. Chega a desoras a casa só porque passaste a noite a apreciar as estrelas. Viaja sem rumo certo. Conta anedotas e ri-te delas. Pratica o amor em todo o lado. Mergulha mar a dentro à luz da lua. Cozinha banquetes a dois. Ignora o que te aborrece. Prepara carinhosamente a marmita que os teus pequenos levam para a escola. Deixa bilhetes de amor espalhados pela casa. Conta histórias inventadas e verdadeiras. Agradece a manhã, a tarde e a noite. Passeia de mão dada. Ama como uma criança. Ouve o canto dos pássaros e o vento a roçar-se entre os ramos. Salta em poças de água. Brinca ao faz-de-conta. Toca um instrumento qualquer e faz uma banda. Diz à tua filha que ela é a menina da tua vida. Diz à tua mulher que é a dona do teu coração. Ensina o teu rapaz a conquistar o amor. Vive incansavelmente.

passei o resto da minha vida a aprender o sentido da vida e a conclusão a que cheguei é que não tem qualquer sentido, e acertei. Escreve a tua própria história sem pressas. Vai contra a maioria e não sobrevivas. Manda todos irem dar uma volta ao bilhar grande e arrisca. Ignora a estupidez do "tem de ser" e faz só porque te apetece. Ama a tua vida pois ela é a única oportunidade que tens de viver. E viver é tão bonito. A vida é tão bonita. Apaixona-te diariamente por ela. Este é o não-sentido da vida: dar-lhe um início todos os dias e amar tudo como que pela primeira vez.

passa a tua vida toda a viver e a amar estar vivo e serás inteiramente feliz, prometo.

domingo, 9 de outubro de 2016

«Ama-te.
Cada linha do teu rosto é perfeita para que nela escrevas a tua história. Cada curva do teu corpo é a perdição perfeita do amor. Cada desenho da tua pele é uma obra de arte única. Cada sinal é um abuso à autoridade.
Sê a liberdade de um sopro de frescura na tarde de verão que muda uma vida. Não receies a tua própria independência em cada escolha que tenhas de fazer. Enfrenta confiante o turbilhão do quotidiano sempre que ele de ti se aproximar. Escreve e reescreve o desenlace do teu próprio romance e aproveita a leitura. Saboreia a doçura do arrepio escondido num abraço despido. Sorri de lágrimas nos olhos e leva nos lábios a franqueza da simplicidade. Grita de pulmões cheios aos sete ventos a loucura que te faz mover as montanhas e as entranhas. Deixa por entre os teus passos um rasto de mistério intensamente perfumado. Nunca ponhas o pé atrás nas tuas atitudes aventureiras que à partida te levarão a conhecer o impossível.
Orgulha-te do que és e não faças pelos outros. Faz por ti. Faz de ti. Faz-te. Sê a romântica sem limites que sempre foste. Chega sempre fora de horas e a tempo de um suspiro intenso. Vive por amor e morre por ele. Faz da vida um acto de radicalidade. Usa e abusa dos segundos como se o seguinte não existisse. Lê por prazer. Come por prazer. Corre por prazer. Ama por prazer. Vive por prazer. Aqui nada faz sentido se não a fim do prazer que sentimos. A montanha-russa de emoções torna-se na mais viciante diversão que possas experimentar. Veste a adrenalina do inesperado e sai à rua com a saia justa que tanto adoras. Alimenta todos os dias as borboletas que dançam no teu ventre e não prescindas de um toque de pele sincero no entrelaçar dos dedos.
Por muito tempo nesta caminhada de descoberta, amei-te. Amei-te com as forças que nenhum físico alguma vez estudou. Amei-te com estruturas corporais desconhecidas na anatomia humana. Amei-te sem espaços atómicos. E hoje, nesta noite aquecida pelo frio das estrelas, amo-te. Por tudo o que és e de mim fizeste não deixo de te amar com a magnitude que rebenta a escala de Richter. Tens o dom de tecelã de corações. E por tão bem alinhavares as cicatrizes que deixas, tenho de me despedir. Não há quem aguente tamanha perícia amorosa. Amo-te como quem ama pela primeira vez, amedrontado de valentia e coragem.
Amo-te e tudo o que te peço agora é... Ama-te.»
Limpou o desenho deixado pelo sal do choro e expirou. Olhou para o relógio e decidiu que aquela madrugada era a hora perfeita para ser feliz. E amou-se.

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Permite-me uma última dança. Pega-me na mão e leva-me nos teus passos largos num aperto solto pela pista da noite. Temos a vida pela frente até que a aurora se levante na madrugada que se aproxima. O foco prateado incide sobre o abraço embalado ao som do vento que acaricia as folhas como a tua mão a minha face. E o meu corpo e o teu corpo são um que não conhece o princípio ou o fim. Tornamo-nos na forma abstracta que é a consistência do amor concreto. Fundimos suores e arrepios num deslize abrupto no entretanto de pausas no quaternário das estrelas. As respirações fazem-se ouvir em uníssono na melodia do vazio que paira na brisa turbulenta em redor das curvas que desenhamos. Puxa-me e não deixes que te escape pelos dedos enquanto os entrelaças nos cabelos despenteados que esvoaçam selvagens. Inventamos movimentos como quem inventa a existência do ser. E somos. Contamos quatro desde o cinco e começa o espectáculo a dois. Silêncio que se vai amar uma última dança. No clímax dos movimentos incessantes nem damos pela loucura da lucidez que nos deixa longe da razão. Perca-se o auto-domínio e agarre-se tudo o que há para agarrar com unhas e dentes. E que não nos falte a bravia coragem de quem só tem medo de não amar com o corpo e a música cardíaca. Envolve-me a cintura e eleva-me ao céu intocável com a ligeireza de uma tempestade. 
A madrugada traz o peso da despedida nos raios e abranda a cada instante o acontecimento dos dois. Há o agora e há o nada. Entre ambos, nós. Há nós a embeber o profundo do que naquilo que me permitiste dançar-te, existiu. E vamos arrastando a passada e ouvindo o acalmar do peito palpitante. Deixa que te encoste o coração ao meu e viva até ficar sem fôlego. Cinco, seis, sete, oito... e acabou a última dança.

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Como sempre, para sempre.

Mal te tinha olhado e já eras dona do meu coração para sempre. Estavas sozinha como habitual. Passava por ti inúmeras vezes e sem razão aparente, naquela tarde, parei para te reparar. Vi em ti uma calma excitante que me tirou o sossego. Soube logo ali que te tinha de saber.
És uma mulher calorosa que sabe ser. Fitas-me intrigante e todo o meu corpo vira suor frio e tremura. Consegues parecer tão inofensiva e no entanto tão perigosa. Tudo em ti é mistério e não há nada mais desafiante que uma mulher profunda. A tua beleza excede o limite com o escarlate do teu batom e o negro do vestido que vestes em ocasiões especiais. Sentaste-te ao meu lado em modo provocador, cabelo solto para facilitar a viagem do teu perfume abrasador até mim. Deixe-me pagar-lhe uma bebida. Sorriste ao olhar-me. Já tinha passado meia década desde o nosso primeiro aniversário e continuavas a apaixonar-me só com o olhar.
Amo quando te amo como te amo. Tentas ser séria e desmanchas-te em cor enquanto escondes o sorriso envergonhado. Cantas no duche e tens o dom de fazer das minhas camisas peças dignas do teu corpo. Tens o reflexo de água nas coxas e as curvas mais ameaçadoras que irei percorrer. Há o teu beijo vertiginoso e viciante que me leva além do aqui. Danças pelos corredores do hipermercado enquanto fazes as decisões mais importantes do dia. Emaranhas pensamentos que saem certos no papel e fazes-me invejar o copo onde bebes o teu tinto por encontrar o sabor dos teus lábios. E é por isso que te amo.
Passaram vinte anos e sou o mesmo louco. Amo-te loucamente, quero-te loucamente, sei-te loucamente, sinto-te loucamente. E por te ser tão loucamente peço-te que me sejas o mesmo. Como sempre, para sempre.

terça-feira, 19 de julho de 2016

Será a tua pele a mesma desde o último toque? Cheirará o teu corpo ao mesmo perfume que deixaste na almofada? Saberão ainda os teus lábios o que ficou por entre os meus? Haverá aquela íntima timidez no nó deixado no estômago aquando uma simples troca de olhares? Continuará aquele ardor no peito durante um diuturno ósculo? Durará a esperança do que por anos foi impossível? Saberá de cor o teu ouvido o timbre da minha voz? Conhecer-se-ão, não obstante a vida, as mãos que se namoravam a cada segundo de passos dados no correr da calçada?
Passámos a vida a contar passadas. Não arriscámos correr riscos e presentemente nada há por que correr. Calculámos letras e falámos sentimentos. Amámos por dentro e por fora e não de dentro para fora. Víamos com os olhos mesmo sabendo sermos cegos. Cometemos erros acertados e certezas erradas. Virámos os dias noites e os anos do avesso. Voámos com os pés no chão e andámos com a cabeça nas nuvens. Tínhamos tudo para dar errado e tudo para dar certo.
Agora, após largos períodos assinalados por distintas vivências quotidianas, tivemos a azarada sorte de esbarrarmos no acaso do crepúsculo luarento. O tempo parece ter, no entanto, congelado no antigamente, deixando o que havia para deixar e trazendo o que há para ficar. Ambos mudados e constantes no que foi apaixonante ao primeiro encontro. Somos resultado de partidas pregadas por nós próprios por toda a extensão da nossa individual existência. Haverá algum tanto mais desafiante que a porfia entre dois corações teimosamente enamorados?

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Primeiro grande amor

Quando te comecei a amar, esperava por ti à porta da escola para te acompanhar até casa. Íamos os dois para as mesmas bandas e fazia disso um pretexto para te fazer companhia. Dávamos voltas e voltas até me ir embora e construímos assim a nossa primeira rotina. Afinal, como é possível começar-se um amor sem uma rotina? E digo-te, foi a melhor em que caí, a sério.

Talvez nem reparasses mas tentava arranjar sempre algo para me meter contigo, mesmo que fizesse a maior figura de idiota da secundária. Afinal, como é possível não parecer um idiota quando se tenta conquistar alguém como tu? Mexia-te no nariz e aí ficava, envergonhadíssimo mas satisfeito por te fazer sorrir. Imaginava-me de mão dada contigo sem to dizer e não ligava a mais ninguém. Eras uma rapariga simples e por isso reparei em ti.

Finalmente oficializámos o amor que sentíamos. Foram tempos apaixonantes e únicos. Passámos por grandes dificuldades à medida que conhecíamos os defeitos um do outro mas nem assim nos deixámos de amar. Partilhámos tudo o que havia para partilhar e éramos felizes assim. Fizemos promessas, cumprimos umas e esquecemos outras. Sonhámos juntos e traçámos planos de longa data, sem olhar os senãos. Discordava de muitas coisas que fazias mas apoiava-te em todas as decisões que tomavas, mesmo que elas me afastassem de ti. Sempre te preocupaste muito com as pessoas e ficavas sempre em segundo plano. Aguentei muito mas sei que tu também. Afinal, como é possível haver uma relação verdadeira sem suportes recíprocos? Tornámo-nos os melhores amigos um do outro em tempo record. O amor é isso mesmo, ver em ti a minha melhor amiga. 

As coisas começaram a desintegrar-se e começámo-nos a separar aos poucos. Via-te a escapar-me pelos dedos e a desistir da vida como a vias quando te conheci. Não conseguia mais suportar-te e não me facilitavas a vida para que te ajudasse. Afinal, como é possível suportar algo insuportável? Andavas com o mundo às costas e por isso elas te doíam tanto. Já não partilhavas com ninguém esse fardo, nem comigo. Decidi ir, desta vez sem ti. Deixei-te para que, sozinha, te voltasses a construir. Estavas em cacos e não tinha como te consertar por isso fui deixar-te ser quem eras antes da tua auto-destruição.

Passaram semanas, meses, e com o tempo entraram e saíram pessoas das nossas vidas. Pensei conseguir esquecer-te mas no fundo nunca o quis de verdade. Via algo teu por toda a parte. Afinal, como é possível esquecermos o nosso primeiro grande amor? A tua gargalhada infantil era ouvida em todas as crianças, a tua simplicidade era vista em todas as estrelas. De tempos em tempos, admito, ia espreitando a caixa onde guardei tudo o que um dia me deste. Havia sempre uma lágrima que me caía pela cara e um sorriso que ficava. Um dia passei por ti, fingiste que não me viste e continuei caminho. Sei que ainda estás magoada, desculpa. Pareces-me mais confiante, mais... tu. Fico feliz por isso, acredita. Continuas linda, sabes? Eu sei que sabes. Os dias vão passando e nunca irei encontrar em mais ninguém o que me fez apaixonar por ti.

Somos adultos e não sabia de ti há demasiado tempo. Não penses que a distância espacial e temporal ajudou a apagar-te da minha memória. Nunca chegaste a deixar o meu coração, juro. Por não aguentar mais as saudades fui, na esperança de te encontrar, ter ao nosso sítio. Esperei umas duas horas, sabes? até que apareceste. Moras perto e pensei que, mesmo que não por mim, passasses lá só porque sim. Sorte a minha não te teres esquecido de mim nem daquela árvore. Falámos como os adolescentes apaixonados que éramos quando te comecei a amar. Contámos todas as novidades como se nunca tivéssemos sido separados pelo tempo. Rimos e passaram horas até a noite chegar. Finalmente ganhei coragem e olhei-te nos olhos. São tão lindos, sabes?
Da última vez que aqui estivemos não consegui fazê-lo, desculpa. E tu desculpaste. Sei que reparaste no porquê e por isso amei-te. E por isso amo-te. Afinal, como é possível um primeiro grande amor não durar para sempre?

Ela

Ela é tanto ao quanto peculiar nos seus gostos. Não gosta de grandes extravagâncias e deixa clara a sua simplicidade. Faz do pensamento um full-time job e dedica-se igualmente à arte do prazer. Descobre nas mais ínfimas coisas a maior beleza do mundo e não se deixa deslumbrar por grandezas desnecessárias. É pequena mas nunca deu grande importância ao seu tamanho pois crê que uma pessoa se mede por sonhos, não centímetros. Ama de coração cheio e detesta conversas de cabeça vazia. Sabe o que quer, e o que não quer. Duvida de tudo e desconfia de muitos. Gosta de andar pela rua despenteada pelo vento e caminhar descalça na relva fresca. Facilmente fica rosada pelo sol e com madeixas louras nos dias de verão. Passa horas a ouvir a água do rio correr e o canto dos pássaros que por ela passam. Sai de casa a meio da noite para admirar as estrelas e passeia sozinha pela vida. Sonha ser escritora, actriz e uma verdadeira amante do amor. Procura a felicidade na felicidade dos outros, diz bom dia aos velhotes que vão na rua e sorri, sempre. Aprecia o calor do sol mas não se importa com os dias cinzentos. Aliás, ela adora o cheiro a terra molhada e o verde vivo das árvores depois da chuva. Não é de corridas mas sem dúvidas que pela pessoa certa correria meio mundo se preciso. Orgulha-se de ser diferente dos demais e não faz nada para mudar isso. Tem uma paixão incontrolável pela vida, dança e crepes. Não acaba um dia sem que ela cante e arranja sempre algo para escrever. É meio desajeitada e tímida, apesar de para os amigos ser vista como a extrovertida. Prefere actos sinceros a palavras compradas, flores do jardim a jóias pirosas (ela não usa disso). Gosta de estudar e organiza a roupa por cores, feitios e tipos de tecido. É respondona e dona do seu nariz - que na primavera anda sempre comichoso. Guarda memórias em caixinhas e cartas de amor no meio de cadernos velhos. Não abdica de uma noite sozinha a beber chá e ler um livro por uma noite agitada pelos bares da cidade. É esquisita no que toca a amizades e nem todos os sapatos lhe satisfazem os pezinhos de Cinderela. Cozinha e cose. Arranca umas ervas quando tem de ser e não tem medo de meter mãos à obra para ter o que anseia. Tem grandes objectivos e é perfecionista naquilo que faz. Gosta de velas e de viajar, mesmo que não possa sair de casa. Apaixona-se com facilidade mas vê o amor de uma outra perspectiva. Já perdeu muito e ganhou imenso.
Ela é feliz da melhor maneira... a dela.

terça-feira, 12 de abril de 2016

aMAR

Tinha o sol no olhar, o perfume do mar e as suas ondas no cabelo. Tinha as irregularidades dos grãos de areia desenhados nas costas e a textura do sal na palma das mãos. Sabia escolher os dias perfeitos para brilhar com a simplicidade de uma concha polida e os momentos ideais para fazer soar a maresia como um búzio abandonado. Tinha dentro de si um oceano infinito que por vezes deixava transbordar pelos olhos, não sabendo ainda muito bem como o controlar. Havia algo de apaixonante na sua personalidade como quem vê o poente sobre o ilustre movimento da água salgada ao longe no horizonte. Não se deixava domar e era o mistério em pessoa. De noite era revolto em sonhos que davam à costa por meio de pequenas expressões faciais. A sua voz era arrepiante, tanto quando ríspida como quando delicada. Era a personificação do mar e era impossível não o amar.

sexta-feira, 8 de abril de 2016

Palavras faladas

Talvez um dia consiga ser boa com palavras faladas. Saiba que dizer quando tenho de falar e não guardar tudo para o papel. É muito mais fácil quando as frases previamente pensadas saem perfeitas nas folhas do caderno usado. Talvez um dia possa ter o poder de abrir a boca e sair um texto nunca antes escrito por mim. Deixe fluir a melodia das sílabas certas nos tempos certos.
Isso ainda não me acontece. Atropelam-se as letras e as pausas parecem infinitas. É um turbilhão constante na minha cabeça, de ideias e questões, que na hora de sairem, ficam presas na língua à espera que alguém as consiga arrancar.
Talvez um dia seja capaz de te falar tudo muito bem falado, como se te escrevesse com a voz. E tu retribuas sonoramente com esse teu timbre único e viciante, que de certo modo me serve de inspiração para um diálogo minimamente digno de ser projetado para o ar. Ando um pouco enferrujada no que toca a conversas a dois, onde um és tu e outro eu. Já não faz parte do meu histórico recente de acontecimentos a música que sai da tua boca e, quem sabe, por isso seja tão difícil para mim comunicar de novo contigo. Se me fosse permitido escrever enquanto me falas, seria simples mostrar-te as minhas opiniões e pensamentos. Mostrava-te aos olhos o que os ouvidos não conseguem alcançar. Saberias de outra forma o mesmo. Eu.
Talvez um dia não precise desse atalho por entre as linhas da folha e te consiga olhar nos olhos e chegar aos ouvidos. E aí, serei boa com palavras faladas.

sábado, 19 de março de 2016

São altas horas da noite e continuo sentada na cama, embrulhada em mantas, a ouvir a chuva a cair na varanda. Estamos em março e parece o primeiro dia de inverno. Lembro-me de todas as conversas longas que tivemos em tempos e sinto-me vulnerável a sentimentos desta magnitude. Tento calar os pensamentos com uma ou duas músicas sussurradas para não acordar ninguém. Chove tanto. A luz dos candeeiros da rua espreita pelas persianas e admiro a dança da chama da vela que me faz companhia. Gosto do silêncio da noite interrompido pelas gotas de água fria que batem no telhado. Pode ser bem deprimente uma chuva destas passada a sós connosco mesmos. Começa a vir o sono sorrateiramente e encosta-se a mim devagar. Acomodo-me à almofada e puxo os lençóis até ao cimo da cabeça. Não há melhor canção de embalar que aquela que me vai adormecer. A pouco e pouco vou desligando as vozes na minha cabeça e o vazio volta a abundar. Daqui a pouco volta tudo ao mesmo, mal caia no sono e comece a sonhar. Continua a chover. Deixo a vela arder e rendo-me ao peso das pálpebras. Bons sonhos.

terça-feira, 15 de março de 2016

Andar de coração dado

As pessoas andam de mão dada e coração trancado. Nem conseguem imaginar o quão errado isso é. Entrelaçar os dedos fazemos todos os dias, nas nossas próprias mãos, nos sacos das compras, nos fios de cabelo emaranhado pelo vento, nas linhas de alinhavar, nas correntes de ar, nos dedos de outra mão. Isso pode ser saciante,  mas é insuficiente. Não basta andarmos de mão dada às pessoas, pois isso seria iguala-las a objectos sem vida. Disparate. Tudo muda a partir do momento em que se anda de coração dado a alguém. Ah, isso sim é correcto! Já experimentaram tal sensação gratificante? É como tocar com a pele e com a alma. Inexplicável. Só quem anda de coração dado sente explosivamente... o amor. Só os amantes da vida dão as mão sem esquecerem o coração. É um dois em um que devia ser obrigatoriamente inseparável, mas as pessoas esquecem-se do coração quando dão as mãos e fica só carne com carne. Impossível alguém se contentar totalmente com isso. "Sai à rua de coração dado e não te esqueças das mãos" - seria assim o acertado de se dizer.
Meu amor, vamos passear de coração dado pelas ruas da cidade.
Nunca, jamais em tempo algum desistas dos teus sonhos. Por mais caricatos, invulgares ou ingénuos que sejam. O mundo é uma máquina alimentada a sonhos. Traça, rabisca, risca e arrisca. Sê cuidadoso nos projectos que fazes pois na vida não nos é permitido fazê-los a lápis. Corre sem olhar o tempo e faz os impossíveis pelo que sonhas de olhos abertos. Quero lá eu saber dos "ses" das inseguranças de um resultado perfeito. Não busco essa coisa que não existe - perfeição. A verdadeira procura está no prazer que nos é proporcionado pelos nossos próprios sonhos, essa é sem a menor dúvida a única caça ao tesouro que tens de fazer enquanto vives. Pois, não há tesouro maior não é verdade? Dá prioridade ao que anseias de coração e entranhas. Deixa de lado o desnecessário ao teu sucesso pessoal e intimista e dá utilidade às asas da tua mente. Não penses sequer no medo que podes vir a ter no entretanto da jornada. Vai com medo, que se lixe. Desistir não está na lista de opções a fazer! Que adrenalina queres mais além da que te é dada pela corrida de resistência/obstáculos que tens de fazer para alcançares O sonho? Não esperes por milagres de finais felizes sentado no chão do quarto enquanto pensas no universo. Faz um favor a ti mesmo e ao mundo, não desistas dos teus sonhos, nunca!

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Podes ser quem queres ser, desde que acredites. És muito mais que essa tua faceta de ser humano sem um pedaço de arte. Podes crer que quando não te limitas ao que há somente no teu círculo de conforto, consegues viver o equivalente a mais cem anos. Não te deixes andar por aí sem saber que usaste o máximo de ti, aqui. Faz de cada momento o palco da tua vida e torna-te protagonista sem receios. Grita! Dança! Faz de quem não és e acredita-te ser capaz de tudo! Ri e chora sem fingir! Vive, não sobrevivas! Agarra o intocável, observa o invisível e cheira o inodoro! Mostra ao mundo o teu e partilha-o com quem sente como tu. Somos uma família de artistas ocultos. Somos uma multidão de seres dotados de aptidões ainda por usar e abusar. A vida é um espetáculo sem ensaios, improvisa!